O meu tio Pedro irmão mais velho do meu pai emigrou muito novo para os Estados Unidos. Já casado e com cinco filhos atrás. Antes de emigrar, quando regressou da tropa onde aprendeu algumas coisas de enfermagem, ele passou a ser um "enfermeiro de serviço"'
em Ponta Delgada. Numa altura em que poucos eram os carros na freguesia e o Centro de saúde ficava a mais de duas dezenas de km por trilhos pedonais, os serviços dele eram uma mais valia para aquelas gentes.
Quando conheci o meu tio, já era uma menina com dez anos. Veio de férias com a família, mostrar aos filhos a terra onde nasceram, visitar os que ficaram e matar saudades de um bom prato de lapas. Para vê lo satisfeito era por um prato de lapas cruas na mesa. Nisso sem dúvida éramos muito semelhantes.
Nesse verão, como era habitual nas férias da escola, o meu pai levou-nos o dia inteiro a mondar uma tapada, a dos Grotões. O meu tio juntou se a nós, pegando numa foice e cortando fetos rapidamente como se nunca tivesse saído daqui. Paramos para almoçar uns papos secos fresquinhos (apanhamos a carrinha do pão logo de manhã cedo) com queijo e enquanto comíamos o meu tio contava nos histórias dos americanos, dos italianos e dos mexicanos com quem convivia. Recordava histórias dos seus namoricos antes de casar. Era um verdadeiro contador de histórias e a sua gargalhada era inigualável. Às vezes quando miúda, o meu pai dizia que eu a rir era como o seu irmão Pedro.
O meu tio já partiu. Hoje recordo com saudade o quanto era bom um prato de lapas na mesa, as suas histórias e a sua contagiante gargalhada.