“Histórias das Minhas Gentes #47”

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Duas histórias. Duas notas. Uma de 20 escudos, outra de mil escudos.

Ainda morava na casa velhinha e a minha mãe parou na casa dos meus avós para nos levar para casa. Vinha exausta de assentar blocos na casa nova junto com o meu pai. Confiou-me uma nota de vinte escudos e disse: Maria, vai à loja do primo João Medeiros comprar uma caixinha de Pastora. Pastora era a marca da margarina que usávamos para barrar as grossas fatias de pão caseiro que a minha mãe cozia no forno de lenha ou o pão de padeiro da padaria do sr. Belmiro. A tarde estava ventosa e eu apesar de ser uma criança muito pacata, às vezes, só as vezes, era meia aluada! Rodopiei a minha roupinha ao vento, cantarolei e desfilei o meu corpinho frágil de quatro anos com a nota de vinte escudos aberta na palma da minha mão. O vento matreiro arrancou-ma por entre os dedos e quando me apercebi a nota já voava bem mais alto que a minha cabeça. Eu juro que bem corri e a tentei apanhar com todas as minhas forças. Quando esta já tinha passado da loja do sr. Francisco Raulino, a chegar ao cruzamento, desisti… voltei a choramingar, arrependida de não a ter segurado com mais força, arrependida do meu rodopiar, do meu cantarolar. Agora tenho de admitir, a minha mãe foi tão serena, tão benevolente, talvez tendo em conta a minha tenra idade e o meu choro arrependido. Voltou a dar-me outra nota que segurei com todas as minhas forças e que fui trocar pela caixinha de margarina.

Anos mais tarde, com incumbência semelhante, fui a loja da minha tia Fátima. Olho para a berma da estrada e muito enroladinha, vejo uma nota de mil escudos. Parei e hesitei: pego, não pego? Não peguei! Na minha ingenuidade ou tolice, achei que o dono daquela nota ia voltar para a pegar. Fui solidária!

Chego a casa e caio na tolice de contar à minha mãe: mãe,  encontrei uma nota de mil escudos!

- Onde está ela?

- Deixei-a para o dono, que deve voltar para apanhar… (aí já corei de vergonha… percebi a minha ingenuidade tarde demais!)

- Ah tola! Deixaste-a para outro que veio atrás!

Desta vez a minha mãe foi implacável!

Uma coisa é certa: não teria enriquecido com aquela nota de mil!

Perfil do Autor

Nascida a 08 de maio de 1979, natural de Santa Cruz das Flores, fez ensino primário na freguesia de Ponta Delgada, ilha das Flores onde residiu durante a sua infância e juventude. Concluiu o ensino secundário na Escola Básica e Secundária da ilha das Flores. Foi subdiretora do Jornal As Flores entre o período de 2006 e 2007, assumindo depois o cargo de diretora do mesmo jornal entre o período de 2008 a 2012.

Atualmente é assistente técnica no Município de Santa Cruz das Flores, mediadora de seguros, colaboradora no jornal digital 9idazoresnews e correspondente da RTP/Açores.

Maria José Sousa

Nascida a 08 de maio de 1979, natural de Santa Cruz das Flores, fez ensino primário na freguesia de Ponta Delgada, ilha das Flores onde residiu durante a sua infância e juventude. Concluiu o ensino secundário na Escola Básica e Secundária da ilha das Flores. Foi subdiretora do Jornal As Flores entre o período de 2006 e 2007, assumindo depois o cargo de diretora do mesmo jornal entre o período de 2008 a 2012. Atualmente é assistente técnica no Município de Santa Cruz das Flores, mediadora de seguros, colaboradora no jornal digital 9idazoresnews e correspondente da RTP/Açores.

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