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( no 150 º. Aniversário do seu nascimento)
A 19 de junho de 1871, nascia em Santa Cruz das Flores aquele que é considerado um dos maiores poetas açorianos, imediatamente a seguir a Antero de Quental e Vitorino Nemésio. Este último, situou-o ao lado de António Nobre, Camilo Pessanha e Eugénio de Castro, figuras importantes do “simbolismo” português.
Seus pais eram Fernando de Mesquita Henriques e Maria Amélia de Freitas Henriques, descendentes da mais importante nobreza açoriana.
O pai, natural de Santa Cruz, era um importante proprietário e secretário da Administração de Concelho, pagador de Obras Públicas e mais tarde advogado de provisão ou solicitador. A mãe, que era prima do pai, nascera na vila de Lajes das Flores e o respetivo casamento realizara-se a 19 de abril de 1869.
Após frequentar a Escola Régia de Santa Cruz, Roberto faz o exame de 2º. Grau da instrução primária em 1885. Em setembro desse ano segue para Angra do Heroísmo com o irmão Carlos, que era um ano mais velho, aonde frequentam o liceu daquela cidade. Os seus estudos nessa cidade não foram contudo muito bem-sucedidos, ao que se julga, devido à hostilidade de um professor, o Padre António Mariano de Sousa, que era um velho inimigo de seus pais.
Recorrendo ao ensino do Liceu da Horta, em 1887, nesse estabelecimento de ensino faz o exame de 1º.ano, onde foi aprovado por unanimidade a todas as disciplinas. Uma excelente classificação, é por ele conseguida no ano seguinte em todas as matérias do 2º. Ano. Em outubro, matricula-se no 3º. Ano e com seu irmão Carlos tem por professores Rodrigo Guerra e Ludovico Meneses, ambos escritores que lhes incutem o gosto pela literatura, admitindo-os na tertúlia da redação do Jornal “O Açoriano”. Mais tarde Roberto de Mesquita e Carlos de Mesquita, dedicariam nas páginas desse periódico, poesias aos seus professores Rodrigo e Ludovico.
É todavia nas Flores, no Jornal florense “O Amigo do Povo”, em 1 de março de 1890 (aos 19 anos) que publica o seu primeiro poema com o pseudónimo de Raul Montanha. No ano seguinte já com o seu nome, colabora nos jornais “ A Ilha das Flores” e “O Açoriano”.
Provavelmente por dificuldades económicas do Pai, terá sido obrigado a abandonar os estudos, ocupando-se durante alguns anos nas secretarias diversas sediadas na vila de Santa Cruz, então ocupadas por parentes seus. Em 1892 publica poemas no “O Açoriano”, jornal da cidade da Horta. No ano seguinte colabora na “Revista Faialense” e projeta um livro de poemas que entretanto não consegue publicar.
Em agosto de 1894 desloca-se com o pai à cidade da Horta, onde se apresenta à inspeção para recrutamento do serviço militar, de que fica isento.
Em 1896 (aos 25 anos) seria eleito vereador substituto da Câmara Municipal de Santa Cruz e nesse ano faz também concurso para escriturário das Finanças, sendo então colocado em Ferreira do Zêzere, por despacho de 13 de agosto desse mesmo ano. A seguir, requer a sua transferência para a Secção de Finanças de São Roque do Pico, onde é colocado nos finais do mesmo ano. Aí convive com o poeta parnasiano Manuel Henrique Dias, enveredando pela corrente espiritista que marca alguns dos seus poemas.
Ainda com a categoria de 3º. Escriturário, é transferido a 2 de abril de 1898 para a Secção de Finanças de Santa Cruz das Flores. Em face dos seus vastos conhecimentos profissionais, a 6 de agosto de 1900 é nomeado chefe da Secção de Finanças de Lajes das Flores, lugar que ocupa até 23 de março de 1901, altura em que volta ao seu lugar em Santa Cruz. Todavia, seis meses depois, voltaria ao mesmo serviço na vila das Lajes.
A sua promoção a 2º. Aspirante viria a ter lugar na Secção de Finanças de Santa Cruz a 12 de abril de 1902, depois de ter sido atestado pelo Escrivão que “dava provas de muito zelo pelo serviço público, a que se dedicava com inteligência, sendo além disso dotado de conduta irrepreensível”.
Mediante concurso realizado em Lisboa durante o mês de fevereiro de 1904, é nomeado Escrivão, tomando posse da chefia da Secção de Finanças de Santa Cruz das Flores a 5 de junho desse mesmo ano.
Em 1911, face a um desfalque encontrado na Tesouraria por uma inspeção de Lisboa, acabada de desembarcar na Ilha, de que resultou o suicídio de Francisco António da Silveira, então tesoureiro e seu cunhado, Roberto de Mesquita é envolvido num processo disciplinar. Segundo a imprensa da época, o desvio provisório visava satisfazer necessidades financeiras do Barão de Freitas Henriques, encarregado da Estação Postal da vila santa-cruzense, que entretanto, havia desaparecido temporariamente, presumindo-se que saíra repentinamente da ilha (nesse mesmo dia da chegada dos inspetores). Corrido o processo, o Barão acabaria por perder tudo o que tinha, enquanto que Roberto de Mesquita, corresponsável pelo Serviço da Tesouraria da Fazenda Pública, como chefe da Secção de Finanças, embora inocente do desfalque, era punido com a sua transferência para a ilha do Corvo, onde toma posse da respetiva Secção de Finanças a 13 de abril de 1912 , aí mantendo-se até ser transferido no ano seguinte, novamente para a vila de Lajes das Flores, a seu pedido. Aí é novamente submetido a novo processo disciplinar por atraso nos serviços, não sendo, contudo, castigado, devido ao seu bom comportamento, conforme atesta o inspetor Júlio Batista. Finalmente volta às Finanças de Santa Cruz no começo de outubro de 1919.
A 26 de dezembro de 1923, após uma semana de doença, é acometido de um desmaio ao levantar-se de uma cadeira de descanso. Assistido pelo médico da vila Dr. José Jacinto Armas da Silveira, seu primo, mantem-se acamado nos dias seguintes. Delirante, balbuciava poemas em português e francês.
A 31 desse mês, falecia Roberto de Mesquita, ainda longe da fama que viria a ter.
O seu funeral realizou-se no dia seguinte, com a participação de muitos dos seus amigos florenses, e com a presença da filarmónica “União Musical Florentina” a que ele havia pertencido como executante de 1º. clarinete.
Conforme a respetiva certidão de óbito fora acometido de “tabes dorsalis” uma doença degenerativa dos neurónios.
Entretanto, havia casado em 31 de maio de 1908 com Maria Alice Lopes, professora primária, natural e residente em Santa Cruz das Flores. Na 2ª edição de “Almas Cativas”, Pedro da Silveira, que faz uma excelente recolha de elementos históricos sobre o poeta, anota que Roberto de Mesquita, em 1907, “já de casamento aprazado, inesperadamente pôs termo a um namoro de alguns anos com uma filha (Maria José) do médico Dr. Júlio César de Caires Camacho” e acrescenta, “segundo testemunhos que colhi em Santa Cruz das Flores entre 1949 e 1951, foi o único amor do poeta”. Sobre o casamento do poeta, Pedro da Silveira escreve que “Nunca se entenderam muito bem”, “Separava-os a sensibilidade e a cultura”.
Por sua vez, Manuel Ferreira, que baseia grande parte do seu livro (O Segredo das Almas Cativas) no trabalho de recolha de Jacob Tomaz, que havia passado muito do seu tempo disponível conversando com a irmã do poeta Maria Leonor — a fiel depositária dos seus sonhos e desabafos — entende que o grande amor de Roberto de Mesquita terá sido a pequena Maria, que falecera ainda em idade escolar. Seja como for, na ilha das Flores, muitas pessoas afirmavam que o poeta não fora feliz no casamento, o que se refletia com evidência em parte dos seus poemas.
Sobre os amores ou desamores do poeta, interessa acrescentar que, em 10 de Setembro de 1897, o Jornal “A Ilha das Flores”, que no tempo se publicava em Santa Cruz, noticiava: “Consta que o Sr. Roberto de Mesquita pediu em casamento a exmª. filha de do senhor Avelino, empregado das Obras Públicas nesta ilha”.
Mas é como poeta que Roberto de Mesquita se distingue. Depois de ter iniciado a sua colaboração em vários jornais e revistas açorianos, os seus poemas aparecem também na imprensa continental, sobretudo depois da sua ida a Lisboa, Coimbra e Viseu, em 1904, quando foi fazer exame para Escrivão. Nessa ocasião, como o irmão estava a lecionar em Viseu, mas já integrado na tertúlia de Coimbra junto dos maiores expoentes do simbolismo português, este propiciou-lhe contato pessoal com variados escritores da época, designadamente com Eugénio de Castro e Manuel da Silva Gaio, poetas por ele admirados.
Os seus poemas aparecem então em “Ave Azul” (Viseu), “Os Novos” de Coimbra e “ Ilustração” que se publicava em Lisboa. Nos Açores, colabora, para além dos jornais e revistas já referidas, em “O Açoriano Ocidental” e “Florentino” (Santa Cruz), no “Faialense” (Horta) e “Actualidade” (Ponta Delgada).
Refira-se a propósito que, quando em 15 de abril de 1917 o jornal “O Açoriano Ocidental” apareceu em Santa Cruz das Flores, Roberto de Mesquita integrava o seu corpo redatorial com António Maria Henriques, Fernando Amorim Armas; Fernando Joaquim, Armas Jr, Jaime Leal Páscoa, João Rodrigues Magalhães, José J. Armas da Silveira, Júlio C de Almeida, Manuel Pedro Lopes, Maurício António de Fraga, Rodrigo Armas e Urbano Lino de Freitas.
A partir do seu falecimento, a obra do poeta permanece algo esquecida não obstante os apelos de alguns para que a mesma fosse editada. Assim acontece, com o impulso de Júlia Mesquita, sua irmã, que incentiva a viúva Maria Alice Lopes a fazê-lo, promovendo assim a edição de “Almas Cativas”, onde são inseridos muitos dos poemas de Roberto Mesquita, por elas selecionados. Júlia Mesquita, que vivia em Lisboa onde era professora, ao visitar as Flores, leva consigo o acervo escolhido para essa publicação, encarregando o amigo do poeta falecido Marcelino Lima, escritor faialense, de prefaciar a obra com um texto por ele intitulado de “Comentário”. Assim, suportada a edição pela viúva e pela irmã, a sua primeira edição (de 300 exemplares) foi editada pela Minerva de Famalicão.
Por ocasião do cinquentenário da morte do poeta, em 1973, novo livro de “Almas Cativas e Poemas Dispersos” foi editado pelas Edições Ática. Esta edição, mais completa pois a adição de novos poemas, “aparece, graças ao zelo de Pedro da Silveira, com vista a que a mesma ajude a colocar Roberto de Mesquita no rol dos poetas lidos, estimados e estudados”, como escreve o autor do prefácio o poeta e professor Dr. Jacinto Prado Coelho, da Faculdade de Letras de Lisboa. Essa edição, além de incorporar o retrato (de 1921) de Roberto de Mesquita, contem excelentes documentos anexados por Pedro da Silveira.
Em 1983, a Secretaria Regional da Educação e Cultura assume a responsabilidade financeira da 3ª. edição de “Almas Cativas”, cujo texto é repescado do jornal académico “O Arauto” que o vinha publicando com a colaboração do Núcleo Cultural da Horta.
Com os títulos de “ Grande Poeta em Pequena Ilha” e “Nota Explicativa e Efemérides”, o Dr. Tomás da Rosa, faz então uma extensa análise poética a “Almas Cativas” publicando diversos artigos no jornal “Correio da Horta”.
Editado pela Câmara Municipal de Santa Cruz das Flores, o livro de “O Segredo das Almas Cativas”, publica poemas inéditos recolhidos por Jacob Tomaz durante os seus contactos com a viúva do poeta, Maria Alice Lopes e com a irmã Maria Leonor Mesquita. Neste livro que está ilustrado com várias fotografias alusivas ao poeta, também se divulga, pela primeira vez, a existência de um grande amor juvenil de Roberto de Mesquita pela Maria, falecida em idade escolar.
Ainda, em 1984, a antologia “Tesouros da Poesia Portuguesa”, editada pela Verbo, dedicou merecida atenção a Roberto de Mesquita, acolhendo nas suas páginas os poemas “Ar de Dia Santo”, “Ar de Inverno” e “Às Grades da Prisão”.
Anteriormente, já o nosso ilustre poeta florense Pedro da Silveira, na sua “Antologia de Poesia Açoriana – do século XVIII a 1975”, insere a biografia e alguns dos poemas de Roberto de Mesquita.
Finalmente, gostaria ainda de deixar aqui um dos seus poemas. Neste seu 150º. aniversário, a minha escolha e a minha homenagem recai no soneto “Exilado”.
EXILADO
Quando a luz vesperal afrouxa no Ocidente,
Pondo saudosos tons na tarde de veludo,
E a mística emoção que transparece em tudo
Tem eco no vibrar dum ângelus plangente.
Para o que em terra estranha evoca o lar ausente
Torna-se o exílio então mais opressivo e rudo,
E no seu coração como um espinho agudo,
Crava-se a nostalgia, agora mais pungente.
Mas ninguém há, como eu, que o seu exílio tenha
Na própria pátria, e sinta essa saudade estranha
Que no meu coração morbidamente avulta
Por vezes, quando à tarde o olhar nos longes ponho:
Saudade de um país mais vago do que um sonho
E que eu nunca hei-de ver, nem sei onde se oculta…
BIBLIOGRAFIA:
“ Florentinos que se distinguiram” de José Arlindo Armas Trigueiro, “O Segredo de Almas Cativas de Manuel Ferreira”, edição da S.R.E.C. de 1983 Jornal “Correio da Horta de 17.7.1984, artigo de Francisco António Gomes , jornal “ A Ilha das Flores de 10.9.1897 e “Almas Cativas e Poemas Dispersos,” Edição (2ª.) da Ática .
António Maria Silva Gonçalves, nasceu na freguesia da Fazenda, concelho de Lajes das Flores a 24 de Abril de 1955, onde reside;
Concluiu o curso geral dos liceus em 1973, ano em que começou a trabalhar na Segurança Social, onde fez carreira;
Ocupou diversos cargos políticos, entre eles: Secretário da Junta Freguesia da Fazenda, Presidente Assembleia Municipal e vereador da Câmara Municipal de Lajes das Flores, presidente do Conselho de Ilha e Deputado Regional pelo círculo das Flores;
Dirigiu e ainda colabora em diversas instituições particulares de solidariedade social;
Coordenou a Revista Municipal de Lajes das Flores, foi subdiretor do Jornal do Ocidente e tem participações dispersas em prosa e poesia na imprensa regional, inclusive no Boletim do Instituto Histórico da Terceira de que é sócio. É autor de “Flores de Outros tempos (da História à Etnografia)” e “Falquejos – textos etnográficos”, dois livros que publicou respetivamente em 2019 e 2020.
Autodidata, são conhecidos ainda alguns trabalhos seus, na música, teatro e ultimamente na pintura.
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