Livres ou acorrentados?!

Isto é o título

O almirante Américo Tomás, em 1958, foi dado como eleito Presidente da República, numas eleições nas quais a oposição, encabeçada pelo general Humberto Delgado, fora proibida de fiscalizar a votação. Em 1965 já foi reeleito apenas por um colégio eleitoral e também assim reeleito em Julho de 1972.

Estava eu, ao tempo, na memorável ilha de Santa Maria e chefiava a Repartição de Finanças, por um curto período, devido à ausência do titular do cargo. Foi então recebida comunicação oficial, na qual era convidado para participar numa “manifestação espontânea” a ter lugar dias depois, no largo junto à Câmara Municipal, para transmitir a satisfação pela reeleição de Américo Tomás.

A eleição era uma tristeza e o convite uma ridicularia! Não me integrei. O Presidente da Câmara, na varanda do Município, foi “surpreendido” por um discurso de “satisfação” dos “manifestantes” e comprometeu-se a transmiti-la ao «supremo magistrado»!

Apesar de me terem feito lembrar a presença da polícia política na ilha (DGS), não me coibi, de vestido com desportivas calças de ganga, me exibir na periferia do largo. Jamais me declarei por isso antifascista. Mas senti a secreta liberdade de não dever nada ao regime. Os poucos participantes certamente não tinham liberdade, ou coragem.

Está aí o 47.º aniversário do 25 de Abril, da liberdade. Recordei-me daquilo que partilhei, a propósito da recente notícia sobre o desfile de comemoração do 25 de Abril, na Avenida da Liberdade, mas no qual nem todos têm liberdade de participar! Era a fatal ditadura. Agora é a execrável radicalização! Para George Orwell, a liberdade “será sobretudo o direito de dizer às outras pessoas o que elas não querem ouvir”. Digam-lhes: eles merecem ouvir.

Pois é; 47 anos depois impõe-se reflectir: há militantes que não têm coragem de discordar do seu líder; há deputados sem liberdade para divergir do seu grupo parlamentar; há titulares de cargos políticos para quem a mesma acção é obrigatoriamente mérito se no governo, e sempre erro se na oposição; há ideologias que se digladiam no confronto e mirram acorrentadas na coligação; há eleitores sentindo-se sem liberdade de discordar publicamente do poder, seja ele regional ou local. Liberdade envolve responsabilidade, pressupõe coragem.

Recorde-se a afirmação de Jean-Jacques Rousseau: “O homem nasceu livre e por toda a parte vive acorrentado”. Se o pensamento do filósofo social e teórico político, dois séculos e meio depois se mantiver actual, comemorar Abril não é verdade, nem afirmação da liberdade.

Artigo publicado no site igrejaacores.pt

Perfil do Autor

José Renato Medina Moura, mais conhecido por Renato Moura.
Nasceu na Horta, em 30 de Julho de 1949, mas sempre residiu nas Flores, onde foi chefe da Repartição de Finanças de Santa Cruz das Flores.
Foi eleito deputado regional pelo PSD nas I, II, III e IV Legislaturas da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, tendo cumprido o último ano e meio de mandato como deputado independente. Foi presidente de diversas comissões parlamentares e vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD.
Representou os Açores na Comissão Luso-francesa. Foi Presidente da Comissão Administrativa da Federação dos Municípios da Ilha das Flores e da Assembleia Municipal de Santa Cruz das Flores.
Foi Presidente da Comissão Diretiva Regional do CDS-PP e Vice-presidente do Partido nos Açores e membro eleito por este partido na Assembleia Municipal da Horta.
Foi Diretor do Jornal “AS FLORES” durante mais de 32 anos e há mais de uma dezena de anos que é cronista com colaboração regular na imprensa regional.
Foi presidente de várias coletividades desportivas, recreativas, culturais e sociais.

Renato Moura

José Renato Medina Moura, mais conhecido por Renato Moura. Nasceu na Horta, em 30 de Julho de 1949, mas sempre residiu nas Flores, onde foi chefe da Repartição de Finanças de Santa Cruz das Flores. Foi eleito deputado regional pelo PSD nas I, II, III e IV Legislaturas da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, tendo cumprido o último ano e meio de mandato como deputado independente. Foi presidente de diversas comissões parlamentares e vice-presidente do Grupo Parlamentar do PSD. Representou os Açores na Comissão Luso-francesa. Foi Presidente da Comissão Administrativa da Federação dos Municípios da Ilha das Flores e da Assembleia Municipal de Santa Cruz das Flores. Foi Presidente da Comissão Diretiva Regional do CDS-PP e Vice-presidente do Partido nos Açores e membro eleito por este partido na Assembleia Municipal da Horta. Foi Diretor do Jornal “AS FLORES” durante mais de 32 anos e há mais de uma dezena de anos que é cronista com colaboração regular na imprensa regional. Foi presidente de várias coletividades desportivas, recreativas, culturais e sociais.

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