Tenho um claro trauma com as fotos. Já aqui referi o episódio da minha profissão de fé em que fui retratada com a pior marrafa de sempre.
Mas o trauma é de uma sequência de fenómenos da minha vida que não me deixam vontade nenhuma de estar perante uma objectiva.
Tudo começou com o meu baptizado. Desse momento, claramente, não me consigo recordar. A minha mãe conta que fui baptizada à pressa. Um bicharoco qualquer mordeu-me, penso que uma centopeia e fiquei com febre e um inchaço tão grande no pescoço, que dada a elevada taxa de mortalidade infantil da época todos acharam que eu ia morrer. Então a minha mãe pediu com urgência o baptizado. O Padre João Lourenço que baptizou todos os meus irmãos, nessa altura estava fora da ilha e ela recorreu-se então ao Padre José Maria que era pároco na freguesia dos Cedros. O meu padrinho Cabral estava a mergulhar de escafandro na Fajã Grande, na apanha do sargaço e foi chamado com urgência para o evento. Conta a minha mãe que passou ainda por Santa Cruz para me comprar o vestido de baptizado. Fotografo? Ninguém se lembrou de tal coisa perante o risco de vida ou morte que eu vivia. Além de que maquinas fotográficas na família não existiam. Ainda bem! Senão teria fotos de mim com um pescoço monstruoso embrulhado em panos e umas bochechas rosadas da febre! Deus me livre! Sobrevivi a esse grande momento da minha vida e sem qualquer fotografia para recordar.
Mais tarde, na minha primeira comunhão, eu estava uma princesa cheia de vaidade. O vestido era praticamente novo, só o tinha usado uma vez numa coroação. A minha mãe tinha comprado uns ganchos do cabelo novos, com umas florzinhas brancas com perolas incrustadas que me seguravam apenas duas mexas de cabelo e o resto estava solto a cobrir me as costas. Tinhas uns sapatos brancos de verniz que tinham vindo numa encomenda do Canadá sobre os quais eu rodopiava e fazia rodar o vestido. Foi uma cerimónia muito bonita com direito a fotógrafo na igreja. Semana seguinte a minha mãe foi a Santa Cruz para levantar as fotografias, com muito esforço porque as fotografias eram um luxo, saíam caras a pessoas de poucas posses. Chegou a casa de mãos a abanar, tinham “queimado” todas. Não havia sequer uma para contar história.
Mais tarde, na minha adolescência quis comprar a minha primeira máquina fotográfica com o dinheiro que recebi de oferta na minha comunhão solene. Era uma Panasonic, salvo erro. Custou-me sete mil e quinhentos escudos. Uma pequena fortuna! Os rolos para a máquina custavam outra pequena fortuna. Revelar as fotos era outra pequena fortuna. Com essa máquina, poucas foram as fotos que não queimaram.
Resumidamente da minha infância guardo religiosamente a meia dúzia de fotos, da minha adolescência excluindo aquelas que não quero exibir para ninguém resta-me outra meia dúzia. Fotogenia não é certamente o meu forte!
Ps - no meu 18º aniversário a minha prima e amiga Maria Emília fez-me o favor de me tirar bastantes! Bem… mas o meu cabelo… nem vos conto!!! E desta vez juro que o corte não foi meu!!