(Continuação dos manuscritos da sra. Fátima Henriques)
" Oh nobre dono da casa
Venha ouvir o meu recado
Levantai vos, vinde ouvir
Novas do primeiro do ano.
Adeus oh dono de casa
Adeus amigos senhores
Muito lhes agradecemos
Seus delicados favores.
No final as pessoas davam laranjas, figos, bolachas, alguns trocos, que no final era repartido por todos os meninos que faziam parte da ronda. Belos tempos, tínhamos tão pouco e éramos felizes sem o sabermos.
Isto foi há 70 anos quando comecei nestas andanças.
Sei a música tradicional.
Dos adultos durante a noite a primeira ronda que participei foi com os meus pais, amigos e família, tinha cinco anos e morria se não fosse com eles.
Minha mãe era a trovadora. O coro era assim:
Cantemos todos em coro
Cantemos com alegria
Já nasceu o Deus menino
Filho da virgem Maria
Assim fomos de casa em casa. Minha mãe tocava bandolim e nalgumas casas bailavamos a chamarrita, era um mar de alegria.
Isto foi há 71 anos, meu Deus como já sou velhinha!
Aqui as pessoas abriam as portas, serviam licores, vinho do Porto, figos, regelos (aqui sra. Fátima, peço que nos explique do que se trata, algum doce? Ou percebi mal a palavra??). Naquele tempo era assim.
Eu ainda sei esta música:
Os três reis do oriente
Sonharam sonharam bem
Sonharam que era nado
O Deus Menino em Belém.
Aceitai disseram eles
Os três reis do oriente
Ouro incenso e mirra
Que vos trago de presente.
A cabana era pequena
Não cabiam todos três
Adoraram o Menino
Cada um por sua vez.
Depois passaram se muitos anos, as coisas pararam, a vida era outra e o tempo mais escasso.
Mas um dia saímos do ensaio da capela da igreja e eu disse: vamos cantar os anos bons. Havia um médico francês e a filha cujo nome não me recordo, que ficaram logo contentes por ir. Fomos cantar aquilo que me lembrava a casa do Sr. Padre Vitorino, do Sr. Presidente da junta Chico Melo, D. Celina, e pouco mais, pois foi tudo rápido. Lembro estes tempos com saudades. Isto deu ideia a junta de freguesia que em 1984 fez um encontro de rondas, tivemos a nossa e ficamos em primeiro lugar. Mas o lugar não interessa, é preciso é avivar.
O rei preto graças ao Sr. Francisco Soares, sempre houve, ele nunca deixou perder. Ponta Delgada também uma freguesia que sempre fez as suas rondas. Tenho muita pena das tradições se perderem porque pode se inovar e acho muito bem, mas não perder o princípio do fio do passado que nos leva ao presente."
Sra. Fátima, eternamente grata por esta partilha. Ficamos todos mais ricos!