Na década de sessenta houve um grande fluxo de emigração nos Açores e na nossa ilha não foi diferente. Da família do meu pai emigraram bastante jovens três irmãos e suas famílias. Meu pai ficou por cá.
Os que partiram, depois de instalados em terras americanas ou canadianas faziam carta de chamada para aqueles que tinham cá ficado. Também houve quem casasse por procuração para poder emigrar. Os que cá ficavam e iam resistindo sentiam se agradecidos e abençoados quando recebiam uma encomenda ou um barril que os familiares emigrados enviavam.
Tive na minha infância uma tia avó paterna de nome Emília, era irmã do meu avô António, que nos vestiu a mim e aos meus irmãos mais velhos durante alguns anos. Ela vivia no Canadá. As encomendas dela vinham em sacas de pano, com letras gordas escritas de feltro preto que diziam: from Emília (não recordo o sobrenome porque era do marido), to: José Sousa. Dentro dessas sacas de pano vinham roupas usadas dos meus primos que nunca conheci (porque quando ela faleceu perdemos o contato numa época sem tecnologias), netos dela: Brian e Nancy. E as roupas apesar de às vezes húmidas de atravessarem os oceanos de barco vinham com aquele cheiro agradável que não sentíamos nas nossas roupas de cá que eram lavadas com sabão azul e branco ou sabão Clarim. Numa dessas encomendas saltou uma linda boneca de cabelos louros cacheados. A minha irmã ainda era bebê, então saiu-me a sorte grande e fiquei eu com a Boneca do Canadá: assim foi batizada!
Anos mais tarde tive outros familiares a enviar nos também barris, isto numa altura em que já andava no liceu, já havia outras posses e havia coisas que os meus colegas olhavam de lado e faziam eu sentir me uma "calafona"!
Adolescência com estilo próprio? Não tive!! Vesti o que os meus primos já não queriam vestir. Mas a minha mãe sempre me ensinou que roupinha lavada e estimada é como roupa nova!