“Crónica da Fajãzinha #7”

Isto é o título

Distância. Intervalo entre dois pontos, dois lugares, dois objetos. A distância entre a Fajãzinha e Santa Cruz das Flores dita cerca de 18km. Em linha reta, numa de Noah ilhéu, passando diretamente pela imponente cascata da Ribeira Grande, conseguiríamos fazer o trajeto em 10km. De qualquer uma das formas o verde ia estar sempre muito presente.  Sem esforço de todo, vislumbramos a erva de meio metro nas bermas da estrada o que torna a viagem e o rótulo de ilha Selvagem cada vez mais uma certeza!

 

E para os curiosos e menos atentos à matemática dou-vos outra indicação, desta feita coordenada Norte-Sul. É que o comprimento da nossa singela ilha das Flores é de 17km, algures entre Ponta Delgada e as Lajes. É interessante saber que ao percorrer o troço Sacavém-Montijo, quando atravessam a Ponte Vasco de Gama (em Lisboa), soma exatamente a mesma distância, 17km. É só a maior ponte da Europa e a ilha mais bonita por metro quadrado que estamos a tentar ligar nesta imagem.

 

Distância é, simultaneamente, por definição, grande diferença. A disparidade entre os 3700 e 3300 florentinos registados entre os Censos de 2011 e 2021, respetivamente, mostra a realidade demográfica da mais periférica ilha dos Açores. Uma década, menos 400 habitantes. A Fajãzinha não foge à regra e aponta menos 6 almas.

 

Mas podemos falar de aumentos. Com a quantidade de carros que circulam nos nossos estreitos caminhos sem bermas, e que chegam quinzenalmente à ilha (a maioria novos SUV), realizei uma sondagem, cuja amostra ascende a mais que um mecânico, que ditou existirem pelo menos três carros para cada florentino. Nesta conjuntura introduzo incoerentemente a rábula do “quer-se um… e não se arranja”. É que a julgar pelo sofrimento dos forasteiros que nos visitam “quer-se um carro para alugar e não se tem”.

 

A distância pode medir-se da base da estratosfera ao nível da água do mar. O horizonte separou desse modo, em junho, o aparecimento na ilha de cruzeiros, iates de luxo com helicóptero a bordo ou voos sui generis como os caças da Força Aérea Portuguesa a abrilhantar em altitude. E enquanto o iate se abrigou na Ribeira da Cruz, os F16 voaram mais alto na costa Oeste.

 

A distância pode, igualmente, significar posição de pouco ou menor envolvimento emocional ou afectivo. Se no Corvo o São João já se celebrou em pompa e circunstância, nas Flores a fraca adesão à vacinação em massa da ´Operação Periferia´ obrigará a manter por mais tempo o distanciamento que satura qualquer criatura antissocial. Parece um castigo aos meninos que se portaram mal, quiçá esteja em causa a liberdade de escolha e obrigue os que optaram, por direito, a evitar a inoculação andarem de pulseirinha no braço. Ainda sobre a operação da vacinação queria dizer-vos que passados dois anos voltei a ser “maior e vacinado”, mas com um braço inchado.  Ainda assim, dizem que esta variante do café, a ´Delta´, é mais perigosa por isso sinto-me ligeiramente protegido e aguento-me bem desperto sem essa mal-amanhada cafeína.

 

Neste contexto, uma das restrições é continuar com o espaçamento entre cada um nas filas, usar máscara nos espaços públicos ou continuar a ver concertos indoor. Se no último caso a desculpa do Covid faz com que não se promova praticamente nada culturalmente, já nas lojas o fluxo pode ser, por vezes, difícil de controlar. Quer pela busca por fruta de Espanha e do Panamá, ou pelo culto ao pão de milho da Lomba ao fim-de-semana, acabamos sempre por esbarrar na 2ª Circular (IC19) ou na Circunvalação (EN12) do comércio florentino.

 

Prosseguindo a desmistificação da distância, podemos dizer que é, no sentido figurado, a diferença entre categorias sociais. Fico triste quando, sobretudo nas redes sociais, vejo alguns camaradas aborrecidos pelo facto de os corvinos receberem mais per capita em relação a eles (concelhos) próprios, no que diz respeito ao futuro investimento europeu. E estando Santa Cruz, simultaneamente, bem posicionado nesse ranking, quanto a mim, só fico com inveja da distância bancária entre as Lajes das Flores e Bruxelas ser maior.

 

Por falar na sede de concelho da Fajãzinha, já temos mais uma câmara online para ver o movimento do que resta do Porto Comercial das Flores. E mesmo à noite conseguimos vislumbrar de tudo um pouco não tivessem os nossos postes de iluminação com novas luzes LED´S. O ambiente, os cagarros e os bolsos das autarquias locais agradecem.

Afortunadamente o clima tem ajudado a estar mais na rua. A uma distância de aproximadamente 100 escadinhas de uma boa vista podemos dar um mergulho nas fantásticas Piscinas Naturais de Santa Cruz. E daqui em diante, além das escadas e trampolins instalados já este mês nas zonas balneares, clicaremos para uma ´selfie´ com o Corvo em segundo plano, novidade digital das Flores.

 

Termino este mês com uma efeméride, o aniversário de Ilda Minha Filha que celebra hoje mais um verão. Finalizando, ainda, com a derradeira interpretação de distância, como o período de tempo que medeia entre dois factos, duas ocasiões ou épocas. Para vos anunciar que entre este texto e a próxima ´Crónica da Fajãzinha´ a separação será não de 31 dias, mas de 62 jornadas. É uma notícia que vos deixará tristes, já sei, mas a crónica volta em setembro e como recentemente li, “posso chegar sempre atrasado, mas vale a pena esperar por mim”.

Ah e não é só a ´Crónica da Fajãzinha´ que vai de férias. Chega hoje às Flores, para o seu descanso, a nossa revisora oficial, a jornalista mais gira das Flores. Beijinho Natacha! 😉

 

 

Fajãzinha, 1 de julho de 2021

 

 

Marco Henriques

Perfil do Autor

Marco Henriques, natural da Fajãzinha, nasceu em 1988 e é licenciado em Comunicação Social e Cultura.

Trabalhou enquanto jornalista no Diário dos Açores entre 2009 e 2011 e é Oficial de Operações Aeroportuárias desde 2012 na empresa ANA - Grupo Vinci.

Colaborou com o jornal “O Monchique” entre 2006 até à sua extinção e é desde 2017, ano em que regressou à ilha das Flores, Presidente da Direção da Filarmónica União Operária e Cultural Nossa Senhora dos Remédios.

Marco Henriques

Marco Henriques, natural da Fajãzinha, nasceu em 1988 e é licenciado em Comunicação Social e Cultura. Trabalhou enquanto jornalista no Diário dos Açores entre 2009 e 2011 e é Oficial de Operações Aeroportuárias desde 2012 na empresa ANA - Grupo Vinci. Colaborou com o jornal “O Monchique” entre 2006 até à sua extinção e é desde 2017, ano em que regressou à ilha das Flores, Presidente da Direção da Filarmónica União Operária e Cultural Nossa Senhora dos Remédios.

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