A ilha das Flores com 10.508 habitantes…. em 1864!

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Em ano de censos decidi elaborar um gráfico com a evolução demográfica da ilha das Flores baseado nos dados disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística, pelo Serviço Regional de Estatística dos Açores, bem como bibliografia consultada no Repositório da Universidade dos Açores, na Biblioteca Digital da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, entre outros.

O primeiro recenseamento geral da população portuguesa, conforme as orientações internacionais, ocorreu em 1864 no reinado de D. Luís. Os seguintes em 1878, 1890, 1900, 1911, 1920, etc.… Os registos paroquiais, obrigatórios desde o Concílio de Trento em 1536, são também uma fonte inestimável de informação estatística de diversa natureza, através dos assentos de nascimentos, casamentos, óbitos, baptizados.

Se por hipótese o leitor pensar que a pesquisa foi trabalho fácil desengane-se, pois, a informação demográfica relativa à ilha das Flores, anterior a 1864, é bastante contraditória entre as diversas publicações académicas. Para o período entre a segunda tentativa de colonização da ilha (primeira década de 1500) e 1693 socorri-me nas obras publicadas por Francisco António Nunes Pimentel Gomes.

No entanto, não só de números foi feita a leitura: involuntariamente fui transportado, por exemplo, à igreja matriz Nossa Senhora da Conceição, em Santa Cruz, mais concretamente ao dia 10 de Abril do ano 1700 em que o vigário procedeu ao baptismo colectivo com os “santos óleos a um extraordinário número de 20 pretos”. Ou seja, para além dos colonos vindos, por exemplo, do Minho, do Alentejo, da Madeira, de outras ilhas dos Açores, ou mesmo de outros países, de Cabo Verde vinham escravos para os capitães donatários e sargentos-mores, ouvidores das justiças, padres, e para as governantas dos senhores. A título de exemplo, só a casa de Alexandre Pimentel de Mesquita, residente na rua de São Sebastião, em Santa Cruz, tinha doze escravos.

Por fim, e seleccionando as fontes que me pareceram mais credíveis, apresento um gráfico com a evolução demográfica da ilha das Flores, como julgo nunca ter sido apresentada até hoje:

Quero chamar a atenção do leitor para que este repare que bastaram pouco mais de 200 anos após o estabelecimento efectivo de pessoas na ilha para esta ultrapassar em número a actual população.

De seguida elaborei um quadro resumo comparando a população legal residente em todas as ilhas dos Açores em 1864 com a população residente em Dezembro de 2019:

Julgo que tal como eu, espantar-se-á quando verificar que as Flores perderam 65,5% da sua população, o equivalente a 6880 habitantes num intervalo de tempo de 155 anos! Um verdadeiro colapso demográfico para a nossa dimensão com efeitos nefastos inqualificáveis enquanto comunidade.

De facto, o problema não é de fácil solução, sejamos sinceros, e contribuem para estes números não um, mas vários factores interligados entre si. Independentemente do resultado dos Censos 2021 a desertificação não é um problema específico das Flores, mas também de outras ilhas ou comunidades económica e socialmente menos desenvolvidas e distantes dos grandes centros urbanos. A receita para inverter a tendência, essa, já está inventada há muito e que foi aplicada nos séculos anteriores por Portugal e por outras nações da Europa: a (i)migração. Não de colonos e escravos forçados pelos seus senhores, mas de cidadãos voluntários, conscientes, aliciados pelas condições de segurança, conforto, habitação, prosperidade e acolhimento que a ilha e sua comunidade possam oferecer, em detrimento dos tumultos cosmopolitas.

 

Fontes e bibliografia consultadas:

.Portal do Instituto Nacional de Estatística – resultados dos Censos.

.Serviço Regional de Estatística dos Açores – Séries Longas;

.A Demografia das Sociedades Insolares Portuguesas. Séculos XV a XXI – Carlota Santos e Paulo Teodoro de Matos – A população dos Açores em meados do século XVIII, Avelino de Freitas Meneses, CITCEM, 2013;

.Actas do III Colóquio  – O Faial e a Periferia Açoriana nos Séculos XV a XX. Nos 550 anos do Descobrimento das Flores e do Corvo. Núcleo Cultural da Horta, 2004;

.O POVO DA FLORESTA ADORMECIDA – A população da ilha das Flores (1681-1720), por Isabel Boavida., “ARQUIPÉLAGO. História”. ISSN 0871-7664. 2ª série, vol. 3 (1999): 177-250.

. “A ilha das Flores: da redescoberta à actualidade (Subsídios para a sua História)”, ed. 2003, de Francisco António Nunes Pimentel Gomes;

. Naufrágios e outros eventos nos mares das Flores e do Corvo, 2015, de Francisco António Nunes Pimentel Gomes;

Perfil do Autor

Nasceu em Santa Cruz das Flores, em 1979. Prossegue os estudos do secundário em S. Miguel onde frequentou, em simultâneo, o Conservatório Regional de Música de Ponta Delgada.
Entre 1998 e 2002 forma-se em Operador Meteorológico na Força Aérea Portuguesa, exercendo funções nas base aéreas de Sintra e Monte Real. Em 2002, integra o Instituto de Meteorologia (actual IPMA), sendo colocado no CMA Flores - aeroporto das Flores. Tira a licenciatura em Ciências Sociais com especialização em Psicologia Social. Entre 2011 e 2013 exerce no CMA Porto - aeroporto Francisco Sá Carneiro. Em simultâneo, frequenta com sucesso os 1º e 2º anos da licenciatura em Direito.
Em fins de 2013 regressa às Flores, exercendo funções no CMA Flores - aeroporto das Flores, como técnico superior na área da Observação em Meteorologia Aeronáutica.
É administrador da página Meteo a Ocidente na rede social Facebook.

Bruno Correia

Nasceu em Santa Cruz das Flores, em 1979. Prossegue os estudos do secundário em S. Miguel onde frequentou, em simultâneo, o Conservatório Regional de Música de Ponta Delgada. Entre 1998 e 2002 forma-se em Operador Meteorológico na Força Aérea Portuguesa, exercendo funções nas base aéreas de Sintra e Monte Real. Em 2002, integra o Instituto de Meteorologia (actual IPMA), sendo colocado no CMA Flores - aeroporto das Flores. Tira a licenciatura em Ciências Sociais com especialização em Psicologia Social. Entre 2011 e 2013 exerce no CMA Porto - aeroporto Francisco Sá Carneiro. Em simultâneo, frequenta com sucesso os 1º e 2º anos da licenciatura em Direito. Em fins de 2013 regressa às Flores, exercendo funções no CMA Flores - aeroporto das Flores, como técnico superior na área da Observação em Meteorologia Aeronáutica. É administrador da página Meteo a Ocidente na rede social Facebook.

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